quarta-feira, 21 de setembro de 2011

TALVEZ VOCÊ NEM LEIA




“vamos celebrar nosso governo, nosso estado que não é nação”
Perfeição – Renato Russo

Diante da tarefa de tornar Rousseau, Locke, Voltaire e Montesquieu algo atraente e instigante para alunos embebidos num universo de tecnologias e interatividade gigantescas, me colocava entre estudantes com média de 15 e 16 anos, armado de giz e pensamentos... Refletir sobre a prática docente, por vezes, gera certa estranheza, um misto de indignação e contentamento, de desgosto e esperança, talvez seja o equilíbrio entre os extremos que nos construa enquanto educadores.
A contradição já se estabelece pela receptividade dos estudantes: enquanto alguns pareciam refletir os ideais iluministas em seus olhares e expressões, outros, consumidos pelo tédio, pareciam abandonados as trevas da alienação. Interessante perceber o vazio que preenche grande parte dos jovens que ocupam as cadeiras escolares, para eles, “herdeiros do mundo da obsolescência”, o conhecimento é descartável, como um celular abandonado no fundo de uma gaveta ou uma roupa da estação passada, estes saberes possivelmente serão esquecidos nas gavetas empoeiradas da memória ou abandonados na próxima esquina.
Paradoxalmente, uma das turmas, envolveu-se na efervescência da discussão, em alguns momentos respiravam ofegantes, com olhares indignados, muitas vezes indignados consigo próprios, por se deixarem vitimizar por mecanismos de dominação política. A dicotomia da situação persistia, pois era engraçado que é justamente assim, como se dá no microcosmo de uma sala de aula, que se tecem as teias da dominação.
O fluxo do conteúdo abordado corria naturalmente, com ironias e frases mais ríspidas, a respeito do que assistimos no cenário político atual. O presente era leiturizado a partir do passado, numa espécie de espiral dialética. Ao término da aula, o sinal que parecia soar como um gongo que encerra o massacre de um pugilista já cansado e derrotado, soou para muitos como uma punição, pois pensar-se enquanto agente histórico é também um processo de autoconhecimento.
É justamente essa contradição, presente no cotidiano da sala de aula, nessa espécie de microcosmo, do fazer-se político-educacional, que se revelam as contradições do sistema. A estratégia, como já é de lugar comum nas falas até dos mais completos ignorantes, é esvaziar as possibilidades de formação de um indivíduo crítico, capaz de questionar-se sobre a contemporaneidade, de visualizar-se como um ser prenhe de conteúdo histórico e agente de transformação da realidade.
Incrível ver-nos calados diante de situações tão indignantes. Revoltante assistir aos noticiários destacando as festividades acerca dos preparativos para a Copa do Mundo e aceitarmos tão facilmente que estes gastos serão pagos pelo nosso bolso, que os contratos para a construção/reforma de estádios só serão abertos depois do evento, que os gastos com modernização das comunicações serão absorvidos por uma emissora privada e que, provavelmente, passado o evento, teremos de pagar mais uma vez para fazer uso... entre inúmeras, tristes e maldosas práticas...
Apenas 5% do que o país arrecada é investido em Educação. Assiste-se ao sucateamento do ensino, quer em escolas públicas, sucateadas, com professores desmotivados, mal remunerados e temerosos da violência, mas também nos colégios particulares, com sua mercantilização dos saberes, a visão da escola-empresa, regida não pela ética cidadã, mas pela lógica do capital. O conhecimento esta nas prateleiras, escondido bem ao fundo, por trás das promoções de notas que asseguram a passagem de uma série a outra.
Destarte, muito melhor para os grupos dominantes a existência de pessoas cuja a preocupação mais importante é a compra de um celular novo, que reveste seu espírito de magia e coloca ordem no seu universo sem identidade, ou ainda inquieto por não saber qual será o seu “look” para a próxima festa, do que uma pessoa questionadora e capaz de problematizar os fios invisíveis que constroem nossa “democracia”.
Infelizmente, muitos que iniciaram a leitura desse texto, em tom de desabafo, desistiram na metade, talvez um pouco antes, ou quem sabe sequer entenderam do que se trata, muito menos que falava justamente deles. Entretanto, é com você que sabe do que eu falo, que tem a consciência do quão importante é a leitura, a formação educacional, o conhecimento... é com você que sabe do papel estratégico que o ensino ocupa para fazer uma verdadeira revolução, não necessariamente do tipo que sejam necessárias armas e mortes, mas do tipo que faça um governo tremer diante do seu povo... Não desista, seja não só mais um idealista, indague, questione, procure meios de mudar e defender a educação, posicione-se favorável ao conhecimento, questione seus governantes... ESTUDE, PENSE, FAÇA!!!




5 comentários:

  1. Inadmissível ver tal situação e não indignar-se!

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  2. Pois é Professor... à quem interessa melhorar a Educação neste país?

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  3. Amiguinho... tu sabe que, por um tempo, eu trabalhei em uma escola num bairro muuuuito hostil de Londrina. E, como sou pedagoga, trabalho até o 5° ano, ou seja, com crianças. Nesse tempo eu cheguei a perder a fé!! As coisas q eu vi, ouvi, presenciei, tanto de colegas de profissão, quanto de alunos e comunidade não tem nem como contar. Triste né?? Não sei como, mas minha fé voltou! E não me tira da cabeça que esse espírito q eu tenho de não me entregar no meio da luta vem justamnte das discussões inflamadas no ensino médio e da família, claro. Tem que ser muito evoluido pra escolher o caminho da docência né? Pq a gente não morre de fome. A gente morre é de desgosto... justamente quando percebemos todo o enredo nefasto que envolve o "suporte" da educação. Cheers!! =)

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  4. É triste, é decepcionante ver e saber o quanto isso acontece atualmente! O desinteresse no rosto dos jovens estudantes, a "falta de rebeldia" quando se precisa e o excesso quando desnecessário. Como formar uma nação evoluída sem formar primeiro o senso crítico num cidadão? Definitivamente, admiro quem segue o caminho de educador.Minha mãe É! e por isso vejo de perto essa realidade.. Mas o mundo precisa de pessoas assim, que não desistam frente aos desafios! Acreditem, vocêis, professores, contribuem para um mundo melhor.

    Aninha

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  5. Pois bem, imagino o desgosto de um bom professor para com um aluno que num quer nada com nada. Ano passado eu ainda cursava o ensino médio e vi o quão difícil é de suportar os desaforos dos alunos,assim como também vi que tem professores que estão lá pelo simples fato de ganhar um misero salario no fim do mês e os alunos que eram interessados passaram a se desinteressar, os melhores alunos passaram a ser os pior por uma revolta de se valorizar só quem não presta dentro da escola, de se lembrarem só de quem não tava interessado. No entanto, vejo que tudo se encaixa agora, os alunos que nada queriam ,continuam nada querendo,usando droga,vendendo coisas ilícitas e sei lá eu fazendo o que. Hoje eu sei que tenho um futuro ilustre pela frente pelo simples fato de ouvir os professores bom e ignorar os não tão bons.E existe sim otimos professores e a esses eu agradeço pelo que me ensinaram.E aos alunos que não se importam com nada deixo um simples lamento.

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