domingo, 6 de novembro de 2011

PELA LIBIDO




Por mais de uma vez se sentiu sozinho naquela tarde. Seus olhos percorriam corpos, perdiam-se em curvas, insinuavam desejos e pareciam gritar a insanidade que pulsava em suas veias. Sentiu vontade da saliva, do suor, da pele macia, dos cabelos presos entre os dentes... sua mente explodia em um turbilhão de desejos, por vezes acomodava melhor o corpo em sua cadeira como forma de disfarçar estímulos e impulsos que sensivelmente percorriam sua pele.
Não conseguia pensar em outra coisa, ficou paralisado, observando o corpo de lado, os contornos da boca, os lábios desenhados, a calça que marcava os quadris bem acinturados, os seios pequenos e a barriga levemente, talvez propositalmente, a mostra.
Naquele momento sentia-se demasiado envolvido, consumido pela libido, seduzido pelo perigo... seus olhos tinham a fixidez de uma tela expressionista e disfarçar era algo impossível, incabível...
Quando ela virou-se em sua direção, um pouco sem jeito, e encarou-o fixamente, de modo tímido, mas muito segura do que queria, ele, homem feito, barba na cara, sentiu-se um menino. De cabeça baixa, com olhares fugidios, mal conseguia fitar outra coisa que não o bloco de rascunhos e as canetas que tinha a sua frente. Reprimia a si mesmo e não sabia o que fazer.  Mal parecia o homem decidido e seguro de si, transbordante de avidez e que há pouco se fazia dono da situação. 
Perdeu o chão, perdeu a rima, esqueceu-se do refrão. Dali até o final do expediente disfarçou por horas afazeres e preocupações. Assistiu-a se perder ao fechar a porta do elevador e rumou direto para casa. Dispensou suas já conhecidas revistas inadequadas para menores e decidiu ficar a sós com suas fantasias e desejos, repelidos pela timidez e insegurança. Alimentou suas lembranças, desenhando loucuras de olhos fechados e com as mãos ocupadas, até relaxar e dormir.

domingo, 30 de outubro de 2011

NAQUELE DIA




Pensava tê-la visto cruzar a rua, há poucos metros de sua casa, correu até a porta e subiu na grade do portão. Ainda era cedo para qualquer alucinação, nem bem o relógio marcava onze horas, o almoço nem começava a ser preparado e a primeira garrafa sequer fora aberta.
Não podia ter sido um delírio e a falta de evidências o perturbava, tinha certeza que era ela... precisava que fosse, e não por acaso, mas por uma despretensiosa pretensão, que por ali transitava, como quem recria caminhos e faz reviver sentimentos que nunca morreram.
Ficou pensativo por alguns minutos. Colocou-se a preparar o almoço, como quem pressentia uma visita de uma antiga novidade que lhe faria voltar a vida. Preparava tudo uma atenção especial: a salada colorida, com várias hortaliças, o cozido com pouco sal, mas algumas ervas finas, o arroz um pouco papento... tudo do jeito que ela sempre gostou. Fazer isso o fazia reviver o passado, a mantinha viva dentro dele. O mantinha prisioneiro de algo que nunca quis se libertar.
Vestiu-se de modo elegante, porém casual, como forma de estar bonito e apresentável, passando a impressão de que não esperava por alguém. Despiu-se da tristeza que lhe fazia companhia, sorriu como nem ao menos lembrava saber sorrir. Cingiu o ambiente, quarto, sala e cozinha, de música viva, que transpirava poesia. Sentou-se ao sofá, com os pés sobre a mesa de centro, assoviava, de modo a parecer espontâneo, o ritmo de canções velhas amigas.
Assistia-se refletido na televisão desligada, enquanto abria a primeira, a segunda, a quinta e a oitava lata de cerveja. Perdeu o apetite. A ansiedade de esperar pela visita não combinada o consumia e adormeceu por ali mesmo, no meio da tarde, enquanto o CD riscado repetia um mesmo verso de uma música triste e conhecida.
Quando acordou, a noite já caía, o dia se ia e levava consigo mais da sua vida, que aos poucos se esvaía, numa angustiante espera alimentada sempre com centelhas de esperança vazia. Perdia-se para ele mesmo, para a prisão que construía, sempre que esquecia o presente e vivia o futuro esperando pelo passado, ressuscitando a morte numa construção convergente do caminho que os unia.


sábado, 15 de outubro de 2011

DALI EM DIANTE PRA SEMPRE




Esperava ansiosamente o dia nascer. Mal conseguiu dormir naquela noite e acordou duas horas antes do relógio despertar. Repassou mentalmente uma dezena de frases de efeito que ensaiou para impressionar. As horas custavam a passar. Roia as unhas, chegou a rasgar um pequeno pedaço de pele que, por vezes, o distraía enquanto se ocupava da dor.
Tomou um banho demorado, olhou-se várias vezes no espelho, ensaiou sorrisos e olhares, e tão logo perfumou-se colocou o jeans e a camiseta nova que a semana toda planejou usar.
Os primeiros cantos dos pássaros começavam a ser ouvidos, alguns raios de sol penetravam ainda discretamente pela cortina entreaberta. Sua cabeça se via povoada de sensações, seus sentidos se embaralhavam, a respiração se tornava ofegante e os sorrisos espontâneos se emaranhavam naturalmente a paisagem.
Enfim havia chego o grande dia. Finalmente o longo período de três anos de namoro à distancia chegaria ao fim e a partir daquele momento ele poderia tê-la ao seu lado não apenas em pensamento.
Era uma manhã de dezembro e mal o dia começava o calor já oferecia o contraponto ao frio que envolvia sua espinha. Precisava vê-la, era urgente, era preciso, como se somente o seu sorriso pudesse tornar tudo real.
Chegou mais cedo a rodoviária, como forma de não ser surpreendido e a cada novo ônibus que chegava mais aumentava a ansiedade e mais ficcional parecia a realidade. O canto da unha do dedo indicador em carne viva o impedia de acreditar que era apenas um sonho. Confuso e embriagado em suas divagações decidia que não era um sonho, pois sonhos não podiam ser tão perfeitos.
Sentia os olhos pesados pelas poucas horas de sono e mal conseguiu identificar o ônibus que se aproximava, porém já sentia o perfume, o mesmo que embalara tantos momentos de felicidade a dois. Quando a porta se abriu e, seguidamente, passageiros que lhe pareciam coadjuvantes desembarcavam, um após um, como forma de delinear com maior emoção os ares de reencontro, um olhar tingiu de alegria, ou quem sabe alívio, aquele momento. Talvez até hoje não consiga descrever a intensidade e confusão do que sentiu. 
Ele sabia, os olhos dela diziam, os dois corações gritavam, aquele não era apenas mais um reencontro, não era só mais um beijo que se repetia, era o prenúncio de uma cena que renovaria todas as manhãs, dali em diante, até o fim dos dias.

domingo, 9 de outubro de 2011

HOJE JOGUEI TUDO FORA



Escrevi esta "divagação" em 11 de julho de 2005, 
revirando algumas memórias virtuais do
meu disco rígido encontrei-a e decidi postá-la.

Hoje joguei tudo fora, na esperança de não mais te encontrar.
Tem vezes que realmente são intragáveis os ares da sua ausência.
Mal consigo respirar que meus pulmões logo se enchem de sua presença.
Cada pincelada no papel se enche de cores tristes e sorrisos melancólicos.
Cada novo grito ecoa no vazio de um coração de paisagem sombria.
Tenho medo de não mais haver lugar para o novo.
De semear o vazio e cultivar o nada, para colher sabe-se lá o que.
A luz do dia me faz vulnerável, mas o quarto escuro não me esconde de mim mesmo.
O espelho reflete com exatidão o meu pesar.
E no lugar do reflexo um não-reflexo. 
E no meu lugar, tudo o que eu deixei de ser quando você me deixou.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

SENTIDO COTIDIANO





O sabor do vinho barato despertava os mais repulsivos instintos. A mesa apoiada em restos do que um dia foi uma cadeira de ferro, retorcida e enferrujada, somava-se a estranha sensação de dividir petiscos de amendoim e salame com seus novos companheiros. O aroma de fritura se misturava ao suor de quem, por horas a fio, empilhara caixas em troca de alguns míseros trocados. Os sorrisos amarelados e as opiniões tímidas eram os artifícios de quem procurava se ambientar a sua nova realidade, embora coração e mente se amargurassem por experimentar a decadência.
Ao voltar do banheiro, com as botas respingadas de urina, tirara uns poucos trocados da carteira, em notas miúdas e amassadas, bem como algumas moedas, que tilintavam nos bolsos da calça de brim desbotada, ressoando no compasso musical da realidade de um trabalhador. Minutos antes, enquanto urinava, escondera num dos bolsos duas notas de maior valor, lembrando que ainda restava muito mês pela frente e manter na carteira somente o necessário para a conta era o melhor modo de ficar a salvo daqueles que rotineiramente se encontravam sem dinheiro, mas sempre com muita sede.
Sentando-se novamente a mesa, ainda reclinou-se e fez alguns carinhos em um cão vira latas que também freqüentava aquele bar com frequência e despediu-se dos colegas.
O caminho até em casa não era longo, mas também não era o que se podia chamar de perto, talvez uns trinta quarteirões, diariamente percorridos em passos largos e não tão rápidos, pois o dinheiro do transporte rendia uma boa ajuda no aluguel. Enquanto caminhava lembrava dos gritos do patrão, do riso dos colegas que pareciam precisar de tão pouco para serem felizes. Lembrava também das contas atrasadas, da vidraça quebrada, da marmita que esquecera na empresa. Pensava que o pouco dinheiro que deixou para o dono do bar poderia lhe fazer falta no final do mês. Pensava... e por vezes quase chorava.
Entristecido via pelas ruas carros que nunca seriam seus, outdoors com propagandas de viagens que nunca faria. Recolhia do chão alguns panfletos, com eletrodomésticos que, mesmo com os prazos e parcelas a perder vista, onerariam demais sua receita.
Atravessou a última rua correndo, antes do ônibus que vinha rapidamente pela via. Alguns flashes ainda desenhavam mais um pouco de tristeza na tela opaca dos seus pensamentos.
Abriu a porta de casa, olhou em direção a cozinha, como quem procurava e implorava pelo sol em dia de tempestade, e ali, diante da mesa, todo o seu mundo mudava, toda a tristeza acabava num sorriso sincero, de quem por ele esperava todo o dia, tendo o dom de dar sentido a todas as dores e colorir toda a tristeza, tornando tudo o que não pertencesse aqueles olhos e lábios apenas restos do que nunca serão.

sábado, 24 de setembro de 2011

AOS DEZ




Ele tinha em suas mãos uma possibilidade que lhe foi arrancada, tinha sonhos como qualquer criança, mas seus pés já estavam muito cansados para poder correr atrás de qualquer coisa.
Um menino e seus brinquedos, brincadeiras sem fantasia, numa realidade cada vez mais vazia, onde fantasiar é cada vez mais raro. Armado com o próprio mundo em suas mãos, fez da realidade sua única abstração, pois já não se vê mais espaço para criar seus próprios cenários de guerra, travar batalhas e vencer inimigos imaginários.
Não é um assassino, mesmo que tenha se tornado. Não foi um suicida procurando vida após a morte. Talvez uma criança com medo de si mesma, com a infância que lhe é roubada pouco a pouco, pela impossibilidade de transitar por mundos imaginários, ruas ensolaradas, campos de batalha, mortes de mentirinha...
Não é o único, nem o primeiro, quanto menos o último. É um espectro que assombra a luz do dia, que não desaparece assim que se fecha os olhos e se protege embaixo de cobertas. É um reflexo, da vida acinzentada, da infância violentada, pela materialidade que lhes rouba a inocência.
Ele desenhava armas, mas as tinha no game de guerra, nos filmes da TV, na gaveta do armário, ao alcance das mãos, porém não as encontrava na fantasia, porque o real privou o mundo de abstrações, de imagens mentais que nos constroem mais humanos.
Era ele, mas podia ser ela, talvez eu ou você. Podia ser vítima e, de fato, também é. Podia ser platéia, mas nesse caso foi ator. Sonhava em ser adulto, mas a realidade já não nos ensina a sonhar.

* Texto escrito com base na notícia do menino que atirou na professora e logo após se matou:

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

TALVEZ VOCÊ NEM LEIA




“vamos celebrar nosso governo, nosso estado que não é nação”
Perfeição – Renato Russo

Diante da tarefa de tornar Rousseau, Locke, Voltaire e Montesquieu algo atraente e instigante para alunos embebidos num universo de tecnologias e interatividade gigantescas, me colocava entre estudantes com média de 15 e 16 anos, armado de giz e pensamentos... Refletir sobre a prática docente, por vezes, gera certa estranheza, um misto de indignação e contentamento, de desgosto e esperança, talvez seja o equilíbrio entre os extremos que nos construa enquanto educadores.
A contradição já se estabelece pela receptividade dos estudantes: enquanto alguns pareciam refletir os ideais iluministas em seus olhares e expressões, outros, consumidos pelo tédio, pareciam abandonados as trevas da alienação. Interessante perceber o vazio que preenche grande parte dos jovens que ocupam as cadeiras escolares, para eles, “herdeiros do mundo da obsolescência”, o conhecimento é descartável, como um celular abandonado no fundo de uma gaveta ou uma roupa da estação passada, estes saberes possivelmente serão esquecidos nas gavetas empoeiradas da memória ou abandonados na próxima esquina.
Paradoxalmente, uma das turmas, envolveu-se na efervescência da discussão, em alguns momentos respiravam ofegantes, com olhares indignados, muitas vezes indignados consigo próprios, por se deixarem vitimizar por mecanismos de dominação política. A dicotomia da situação persistia, pois era engraçado que é justamente assim, como se dá no microcosmo de uma sala de aula, que se tecem as teias da dominação.
O fluxo do conteúdo abordado corria naturalmente, com ironias e frases mais ríspidas, a respeito do que assistimos no cenário político atual. O presente era leiturizado a partir do passado, numa espécie de espiral dialética. Ao término da aula, o sinal que parecia soar como um gongo que encerra o massacre de um pugilista já cansado e derrotado, soou para muitos como uma punição, pois pensar-se enquanto agente histórico é também um processo de autoconhecimento.
É justamente essa contradição, presente no cotidiano da sala de aula, nessa espécie de microcosmo, do fazer-se político-educacional, que se revelam as contradições do sistema. A estratégia, como já é de lugar comum nas falas até dos mais completos ignorantes, é esvaziar as possibilidades de formação de um indivíduo crítico, capaz de questionar-se sobre a contemporaneidade, de visualizar-se como um ser prenhe de conteúdo histórico e agente de transformação da realidade.
Incrível ver-nos calados diante de situações tão indignantes. Revoltante assistir aos noticiários destacando as festividades acerca dos preparativos para a Copa do Mundo e aceitarmos tão facilmente que estes gastos serão pagos pelo nosso bolso, que os contratos para a construção/reforma de estádios só serão abertos depois do evento, que os gastos com modernização das comunicações serão absorvidos por uma emissora privada e que, provavelmente, passado o evento, teremos de pagar mais uma vez para fazer uso... entre inúmeras, tristes e maldosas práticas...
Apenas 5% do que o país arrecada é investido em Educação. Assiste-se ao sucateamento do ensino, quer em escolas públicas, sucateadas, com professores desmotivados, mal remunerados e temerosos da violência, mas também nos colégios particulares, com sua mercantilização dos saberes, a visão da escola-empresa, regida não pela ética cidadã, mas pela lógica do capital. O conhecimento esta nas prateleiras, escondido bem ao fundo, por trás das promoções de notas que asseguram a passagem de uma série a outra.
Destarte, muito melhor para os grupos dominantes a existência de pessoas cuja a preocupação mais importante é a compra de um celular novo, que reveste seu espírito de magia e coloca ordem no seu universo sem identidade, ou ainda inquieto por não saber qual será o seu “look” para a próxima festa, do que uma pessoa questionadora e capaz de problematizar os fios invisíveis que constroem nossa “democracia”.
Infelizmente, muitos que iniciaram a leitura desse texto, em tom de desabafo, desistiram na metade, talvez um pouco antes, ou quem sabe sequer entenderam do que se trata, muito menos que falava justamente deles. Entretanto, é com você que sabe do que eu falo, que tem a consciência do quão importante é a leitura, a formação educacional, o conhecimento... é com você que sabe do papel estratégico que o ensino ocupa para fazer uma verdadeira revolução, não necessariamente do tipo que sejam necessárias armas e mortes, mas do tipo que faça um governo tremer diante do seu povo... Não desista, seja não só mais um idealista, indague, questione, procure meios de mudar e defender a educação, posicione-se favorável ao conhecimento, questione seus governantes... ESTUDE, PENSE, FAÇA!!!




domingo, 18 de setembro de 2011

A MENTIRA DA VERDADE



 


Tudo aquilo que descobrimos logo nos é tirado,
pela guerra, pela paz ou por siglas como H1N1 e HIV.
Aquilo que um dia fui nunca me causou medo,
mas a imensa massa amorfa do que um dia eu possa me tornar me tira o sono.
Novos nomes para antigas crenças, que se pode chamar do jeito que quiser:
religião, ciência, extremismo ou verdade.
A razão nada racional e a fé nenhum pouco fiel,
são o motor que nos move, o combustível que nos aquece,
o sangue derramado em nome do petróleo que corre em nossas veias.
Talvez onze de setembro, quem sabe vinte e cinco de dezembro,
quiçá um quinto dia útil ou um terceiro dia sem ressurreição.
Pouco importa se as verdades vem do Vaticano, da Casa Branca ou Irã,
verdades podem ser apenas mentiras quando contadas do outro lado do muro.
Tudo pode ser nada igual ao que parece e o outro não ser a sombra do inimigo,
embora também não seja sinal de abrigo, mas da diferença que nos faz iguais.


domingo, 11 de setembro de 2011.

domingo, 11 de setembro de 2011

GUERRA SANTA *


* divagação escrita originalmente em agosto de 2006, apresentada 
e teatralizada numa das mostras culturais do colégio Alfa Plazza.

como se fosse arte, vejo luzes rasgarem o breu do céu
como se fosse festa, gritos ecoam descortinando o silêncio que antes se fazia véu
numa mão a espada e na outra a palavra de Deus
violência disfarçada de desejos de paz, com sabores e odores,
o sagrado brota de qualquer canto empoeirado:
relíquias do passado, tecnologias do presente,
promessas de futuro iluminado
de um lado está Deus, do outro também
está em tantos lugares, seja qual for o nome que a Ele se dê
freqüenta tantos altares: igrejas, templos, mesquitas e salas de tv

católico e protestante, budista, muçulmano e cristão,
judeu e pentecostal, hindu, ateu e até mesmo pagão,
atores e platéia: todos responsáveis, todos tem participação
todos julgados, considerados culpados, condenados,
a este caos e confusão
pão e vinho, corpo e sangue,
crime hediondo de transubstanciação:
do pão não repartido em milhares de corpos pelo chão,
do sangue derramado em cálices de petróleo consagrado
pelo capitalismo enraizado em nosso cotidiano de exclusão
Maomé prefere a cruz e a quem bateu em sua face oferece o outro lado, 
em seguida declara guerra, torna evidente a contradição
Violência revelada, escrita e encenada,
no Bhagavad, na Bíblia e no Alcorão
Buda terrorista, kamikaze, pilota um avião, tem destino certo, 
um novo atentado para sua redenção
Mahavira e Krishna embriagados, mais uma festa pagã,
Dionísio e Baco, da uva o vinho, do paraíso a maçã
E a nação do Destino manifesto, democracia ao contrário,
no dólar a face Cristo, como uma imagem no sudário

um só Deus mesmo sendo vários,
algumas vezes ópio do povo nas mãos de mercenários
enquanto isso, eu, você, apenas mais um numa multidão de otários
Deus não está morto, nem pode ser culpado por essa extravagância,
se tornou justificativa da 
Guerra... Santa... Santa... Ignorância